In Publico 1/12/06Rafael Valladares, historiador espanhol, lança livro sobre a restauração da independência de Portugal em 1640, e o "trauma" sofrido por Espanha.
Por Alexandra Prado Coelho
A restauração da independência de Portugal, em 1640, "causou um trauma muito considerável" em Espanha que, com o tempo, "transformou em indiferença a frustração pela perda de Portugal", diz o historiador espanhol Rafael Valladares.
"Até ao final do século XVIII, os governos espanhóis estão constantemente a pensar que possibilidades há de recuperar Portugal. Têm consciência de que sem Portugal dentro da monarquia hispânica Espanha nunca voltará a ser uma grande potência", explica o autor de A Independência de Portugal. "Depois, no século XIX, já num contexto distinto, de Estados soberanos, essa nostalgia da perda de Portugal tem que ser camuflada como indiferença."
E hoje essa indiferença está completamente interiorizada e é inconsciente, segundo o historiador. "Quando digo a alguém que em Portugal não gostam que a companhia aérea espanhola se chame Ibéria, porque Ibéria é toda a península, eles ficam surpreendidos, porque pela primeira vez compreendem que Ibéria não é um nome justo. Ou, quando se pede a uma criança para desenhar um mapa de Espanha, ela desenha a Península Ibérica, e temos que lhe dizer que é preciso separar Portugal. Mas são actos inconscientes."
Ao mesmo tempo, em Portugal existem sentimentos contraditórios. Há quem ainda tenha medo de uma invasão espanhola - já não militar, mas económica - e há, a acreditar em sondagens recentes, 27,7 por cento de portugueses que acham que Portugal e Espanha deviam ser um único país. A "ameaça" não existe, diz o historiador espanhol. "O que a Espanha está a fazer em Portugal, a nível económico, é o mesmo que outros países já fizeram com Espanha: aproveitar o mercado aberto para ampliar negócios."
Mas Valladares compreende a razão que leva alguns portugueses a ter uma "percepção de ameaça". "Portugal foi invadido muito mais vezes por Espanha do que o contrário", diz, embora considere que "esta questão está a ser manipulada, em ambos os países, por pessoas que não são muito responsáveis".
Quanto às "famosas sondagens", está convencido de que não sobreviveriam a um teste de realidade. "Não são uma tradução da vontade de pertencer a Espanha, mas sim uma maneira de protestar contra o Governo de Portugal. Se se fizesse em Portugal um referendo com essa pergunta, os 30 por cento [a favor da união que aparecem nas sondagens] perderiam um zero e não ultrapassariam os três por cento."
Rafael Valladares é muito crítico da forma como os governos dos dois países têm gerido as relações. "Fracassaram totalmente em fomentar uma aproximação mais enriquecedora." Embora "se fale muito dessa aproximação, ela não é totalmente real, é muito desigual e não está a ser dirigida com inteligência". O que o historiador defende é a promoção de um maior relacionamento entre as sociedades civis portuguesa e espanhola, através de associações empresariais, culturais, e outras. "Isso daria um impulso a esse sentimento [dos portugueses] de querer estar próximo de Espanha e levaria os espanhóis a conhecer melhor Portugal."